novembro 27, 2007

Espero que ela use vermelho. na alma.
Que venha sorrindo . sem calma.
E entorne todos os copos. os corpos.
Abra todas as janelas. com pressa.
E depois derrube todas as paredes.
Para que eu me sinta frágil . e protegida.
Para que eu sinta.
E então que ela cresça . desesperada.
E eu assista a tudo. esperando.
Espero que ela venha trazendo vento.
E venha sem medo. sem sono.
Que venha. sem poeira, sem dor.
E traga algo além do que se é desesperado. inesperado.
Espero.

[-poema para um término . amor]

outubro 12, 2007

Um ou quatro quartos. [01.08.2007]


Sentiu na boca uma vontade amarga de mastigar pimenta ou beber whisky. Pensou numa porção de coisas antes de se levantar, afinal amanhã é quinta-feira e emoção demais, ou ressaca, atrapalharia o continuar.

Acendeu o cigarro, e segurou com as pontas dos dedos; não tinha charme algum naquela mão enrugada, mas havia certa clareza na fumaça que saia de sua boca vermelha e sem rumo.

Um pouco de música, de whisky e ausência de roupas ou contato com o superficial. Deitou no chão gelado de quase novembro, e viu-se sozinha como em todas as outras vezes.

E se o telefone tocasse, ou ele estivesse no bar? Talvez o jornaleiro dissesse se ele ainda vem todas as manhãs. E conseguiria sair dali!?

O cigarro apagou, acabou ou só se tornou mais um no cinzeiro. O whisky havia acabado, completou a parte vazia do copo com conhaque. Ela não gostava de conhaque, e o whisky gostava tanto dela... As coisas começavam a ficar confusas.

Abriu a janela para ver a chuva que caia, limpando o céu novamente, debruçou-se com os seios a mostra, sem se preocupar com os vizinhos que, provavelmente, estariam vendo a novela, o futebol ou a amante...

Estaria ele com a amante ou a amante seria ela?

julho 30, 2007

29/07/2007
Um fim de domingo frio e o fim de outras coisas...

Ela ainda estava procurando seus sapatos quando o telefone tocou e ele disse que não iria encontrá-la naquela noite, nem na noite seguinte.
Acomodou-se na sala, sentada em uma almofada, bebia um chá muito quente e remexeu na sua velha caixinha verde e desbotada, procurava algo dela que a fizesse lembrar-se dos outros.
Tentou encontrar uma explicação para aquele fim tão triste, pensava que era por culpa da distância e do tempo, mas isso não explicava todos aqueles abraços cheios de dúvida, e não explicava todos aqueles momentos juntos, em que só havia a ausência dos dois.
Sentia que nos abraços dele, os braços não estavam certos, não estavam como deveriam estar, e que a respiração dos dois se extinguiam, ao invés de se completarem, será que foi isso que fez ele pensar que aqueles corpos não se pertenciam?
Mas deve haver alguma outra explicação.
Adormeceu escutando uma canção triste, e sonhou que estava perdida, num mundo estranho e psicodélico, e que entre todas aquelas flores e cores as pessoas apareciam apenas em partes: os olhos quase-verdes, a boca meio-ressecada, o coração semi-aberto.
E tentando remontar aqueles corpos, via que aquilo não havia sentido algum, como se os braços não estivessem no lugar, ou que os olhos só se mantinham abertos quando não havia um coração.
Acordou sem sentir muita coisa, além do frio e da certeza de que valia continuar.
Se encontraram alguns dias depois, abraçaram-se e ela sentiu, naquele último e atrasado momento, que eles jamais estiveram juntos, não para ela.

julho 05, 2007

O palhaço do circo sem futuro


Andava procurando a próxima parada, se reinventava em casa esquina. Não podia com tantas mudanças, mas era disso que sobrevivia.
E tinha mesmo só uma sobrevida.
Guardava no bolso da calça xadrez, as lembranças das noites em que o pai chegava bêbado e vinha carregado por algum bom vizinho.
Guardava no bolso da jaqueta o gosto ruim de ter uma mãe submissa que se suicidou, quando viu que o casamento estava para acabar.
Na carteira, a foto dos irmãos que nunca conheceu, e nem queria.


Era necessário apenas um copo de Rum (ou cuba...) para se despir dos traumas da infância.
Então vestia sua mascara, pintava o rosto e era, todos os dias, o grande palhaço da vida real, o pierrot sem amante, o "clown down" de um show que só acabava no próximo copo de Rum.
Mas as vezes o Rum acabava antes do show,
as vezes acabava antes do bar, do mês, da dor.
E ainda assim as pessoas aplaudiam.

maio 17, 2007

Bárbaras memórias póstumas

Fitei seus olhos de um inesperado azul para encontrar em você algo que talvez falte em mim: a alma exposta; e foi por você ser assim tão claro no que és que decidi me perder em abraços que meus já cansados braços precisavam encontrar.

- Bárbara, ele dizia com aquela voz macia que arranhava tudo-tudo dentro de mim, você não precisa ir embora?
- Eu já vou, e assim eu respondia como quem sente que é tarde e a tarde é a hora de entender como é que tudo se faz, você se importa de ir comigo até aquela fila?

Fitou meus olhos que cantava uma velha cantiga conhecida, que não falava de amor, e no exato momento em que meus olhos se fecharam para sufocar as lágrimas que corriam pelas veias, até tocar a minha alma, que gritava desesperadamente tentando se despir, eu senti sua mão tentando me alcançar. Ao abrir meus olhos, nossos olhos se cruzaram, e tantos outros olhares, dores, rancores, penas e amores se cruzaram também com os meus olhos, que olhavam o sangue no chão e não entendiam.
Então, a alma se calou, as veias lentamente pararam de pulsar, e a cantiga outrora cantada já não era mais lembrada, apesar de tanto esforço, os olhos deixaram de ver, o coração parou de sentir, dos lábios algo como “eu te amo” parecia querer ser dito, e nos ouvidos algo como “adeus” parecia ser escutado.

abril 28, 2007

"Entre por esta porta agora e diga que me adora..."
I

-Lançados ao acaso?
-Nunca mais.

II

Ficou aquela sensação de falta durante as horas que se passaram. Eu vou sempre esperar que você desça pela escada rolante do metrô. Eu vou esperar pelo próximo vagão, na esperança que você venha me dizer que mudou de idéia...

III

Tudo foi tão falso essa noite, como um filme do Woody Allen, que não deu certo... Você dizia certas coisas, premeditando a minha reação, e eu também não dizia as coisas certas...
Foram frases de efeito, que não funcionaram. Sempre atentos para ver quem vai ceder primeiro. Tão orgulhosos, nós dois, nunca cedemos àquilo que chamamos de sentimento.

abril 18, 2007

Um conto mofado

Mais um dia se passa e é nesse intervalo entre a sessão da tarde e a novela das oito que eu quero morrer.
A faca tá longe, o uísque tá mais. Então eu acendo um cigarro, levanto, acabo com o uísque, e depois eu pego a faca e acabo comigo.
Um cigarro, dois cigarros, três cigarros, um maço. O uísque vai ficando mais perto e mais perto. Um gole, dois goles, três goles, uma garrafa.
Então, vem a lamentação. A lamentação e a poesia barata, porque "você não podia ter feito isso comigo, não podia ter me abandonado tão perto do uísque, mas só com um maço de cigarros"
Eu até me levanto, lavo o rosto, e ainda tento ver o jornal. Aquela gente egoísta... O filho mata a mãe e acha que tem um problema maior do que o meu... Troco de roupa, vou lucidamente a padaria.
Três maços de cigarro, três não, quatro! Mais uma garrafa, e então eu vejo você saindo do trabalho. Sempre no mesmo horário; na minha hora sagrada, ou melhor, na hora maldita, de ir a padaria.
Eu paro escondida, e fico te olhando, todo engomadinho, olha para um lado, para o outro, e pega o celular... E você acha mesmo que viver é isso, casa, trabalho, ela, ou ele... Você acha mesmo que sua vida medíocre é que é a felicidade.
Escuta, meu bem, já é quase hora da novela, atravesse logo a rua e vá para casa, que é pra eu poder sair daqui sem você me ver com essa cara de ressaca. Então você se vai, como se tivesse me escutado;
Eu chego em casa e bato a porta. Tem um recado na secretária eletrônica, que podia ser seu, que todo dia eu acredito que é seu, e eu escuto aquela voz de telefonista mal-paga, mal-tratada, mal-amada, cobrando qualquer coisa que era para eu ter pagado na semana passada, ou há mais de um mês.
Então eu vejo a novela, e o cigarro vai acabando, a vodca vai quase num gole. E aquelas pessoas na TV acham que tem problemas maiores que os meus.
Assim acaba a semana, acaba o mês. Eu me lamentando enquanto bebo, bebendo enquanto fumo, e fumando enquanto me lamento...

abril 05, 2007

Clarissa, o nome que ficou no meu espelho durante tanto tempo.

Era teu nome, com a tua cor de batom. Que letra linda você tem, Clarissa! Mas porque escrevestes coisas tão tristes e medonhas?
Usou palavras fortes para dizer que estava indo, e atrasada.
“Adeus, nosso amor não deu certo, e nunca vai dar. Guarde lembranças, Clarissa”.
Guardarei tuas palavras no espelho (permita-me admira-la pela criatividade), guardarei seu cheiro no edredom e seu batom esquecido (ou deixado?) sobre a pia.
Por um instante me ocorre sua imagem (ah, como é bela!) segurando o batom em frente às paredes brancas, recém-pintadas. Eu compreenderia se você tivesse amargado também as minhas paredes, com palavras ainda mais doloridas.
Clarissa, suas palavras estão tão frescas e intensas, e o reflexo no espelho é tão vazio. Eu entendo quando você diz que não deu certo e que nunca daria. Ah, você foi muito leviana, e essas palavras frias ecoam na minha cabeça sem parar.
Adeus, adeus. Eu queria ter dito adeus também. Acredite, eu não imploraria para você ficar.
Você foi injusta, Clarissa. Eu também tinha sonhos. Queria ir a Paris, praticar ioga, visitar velhos parentes, aprender alemão, jogar bilhar no boteco, conhecer o zoológico, ir mais ao cinema. Eu queria tanta coisa, mas você era, naquele momento, a única pessoa com quem eu queria estar. Eu te permiti ter amigos, te permiti ter o próprio mundo, o próprio gosto, te deixei tanta coisa, e você só me deixou a mim mesmo. Clarissa, você foi embora.
Entendo que é para sempre, que foi o ultimo adeus (ah, quantas brigas nossas acabaram em “último adeus”), mas sinto aqui dentro de mim, naquele ponto machucado que a agonia se instala, que você vai voltar, e mais bonita, e mais alegre, e mais cheia de vida, e ainda mais sozinha do que as outras vezes.
Você se lembra que pedi para não dilacerar meu coração? Não me importo de estar sofrendo novamente pelo que você me fez, mas me lembro tão claramente do seu sorriso, Clarissa, você me disse palavras tão bonitas e suaves. Sua voz adocicada me toma a mente de forma tão intensa, que posso te sentir aqui comigo, acariciando meus cabelos louros, apertando minha mão.
Ah, mon aimé, peço que me desculpe por ser tão romântica. A verdade é que sinto mesmo sua falta, e sinto tanto medo de nunca mais te ver, tanto medo de você ter realmente ido embora.Dentro desse quarto verde, olho para todos os cantos, procurando algo seu, procurando os teus braços para me confortar, e me sinto a pessoa mais incapaz do mundo, pois agora todos os sentimentos que me ocorrem formam poesias lindas, mas só consigo repetir seu nome: Clarissa, Clarissa.Se nadas paredes verdes não restou nem ao menos sue retrato, imagino então a sala, toda branca, será que restou seus sapatos altos? Seus livros do Kerouac? Seus enfeites importados?Clarissa, entenda que somente sai da frente do espelho porque precisava saber o que restou de você na casa, e que eu não voltei porque precisava encontrar qualquer coisa sua dentro do cinema, da lanchonete, do bar, do novo amante.Eu não achei nada que te pertencesse. Aquele filme do Hitchcock era preferência minha, o suco na lanchonete tinha o mesmo gosto agradável do “antes – de - você”, de “durante-você” e que teria também “depois-de-você”, e no bar, Clarissa, encontrei as músicas que ouvi a vida toda sem você, encontrei bebidas que já eram charmosas antes mesmo de eu te conhecer, e o novo amante, minha querida, foi escolhido a dedo para eu poder projetar toda a alegria que resgato da juventude, dos sonhos de criança, que não permiti que se mofassem antes das tentativas. E sabe, Clarissa, no espelho ficará eternamente projetado o conformismo de um grande amor perdido, e nos novos amantes (que terão muitos, para mim e para você) projetarei apenas seus sorrisos, Clarissa, você não sabe o quanto é linda quando sorri.