agosto 25, 2012

Mudando de endereço

Era tão bom subir aquela rua,
o dono do sobrado sempre mudava a cor da sua fachada,
nunca soube porque, amarela, branca, carmim.
Outro dia ele pintou de cinza,
então deve ter acabado o dinheiro, não sei,
mas a casa ficou assim... cinza.

Tinha um cachorro, ávido por seu rabo, só parava sua busca para latir pros transeuntes,
certa vez ele fugiu, dias e dias procurando, e eis que o encontraram com seu rabo sangrando.
Deve ter sido tamanha a frustração de conseguir que nunca mais ele foi o mesmo,
não late, não busca bolinha, ocupa-se o tempo todo em sobreviver;

Depois do almoço juntavam-se na praça velhos amigos, amigos velhos,
com suas histórias velhas que sempre pareciam novas,
a idade vinha consumindo a memória deles,
com tanta gula, tanta ânsia,
e os fazia repetir, repetir, repetir e ainda conseguir rir.
Dois morreram,  outro se mudou, uma foi internada, despediu-se do resto da sandice.
Os banquinhos de concreto agora ficam vazios,
as vezes alguém apoia pra amarrar os sapatos, ou procurar o telefone na bolsa cheia de compromissos e obrigações.

A quitanda que virou farmácia que virou perfumaria que virou armarinho
finalmente cedeu às pressões das grandes obras.
Abriram um centro comercial ruas acima,
e aquele casal sem nome, nunca mais vi.

Aquela rua que eu gostava tanto de descer,
reparando nas roseiras florescendo,
no presépio sendo montado,
nas crianças correndo...

Colocaram um semáforo no final da rua,
há algum tempo,
e um dos meus prazeres esquisitos era esperar ele ficar verde pra seguir meu caminho.
Gostava de ficar mais um pouco, pelo menos mais um pouco,
naquela rua, aquela rua.

Hoje passo apressada,
não quero ver aquela cinza,
aquele cão morto,
aquele vazio,
às vezes troco o caminho,
porque dói ver aquela rua que eu tanto passei,
que um dia quis construir morada,
assim, virando assim, isso assim que eu não-sei-o-quê.

Algo me prende a esse logrado,
a lembrança dos tempos idos não sufoca mais a decepção de vê-lo assim tão decadente,
mas algo ainda me faz passar por ali.
Pelo menos por enquanto, por enquanto, por enquanto.

agosto 21, 2012

Decreto de fim de agosto

Consta, a quem interessar,
com data e assinatura,
a valer a partir de amanhã.

Decreto que é proibido ser infeliz.
A partir de agora, sorrisos sinceros,
acima de tudo gargalhadas que só terão seu fim previsto quando a barriga começar a doer.

Decreto que os beijos serão surpresa,
espontâneos e longos.

Consta nesse auto o fim da ironia,
e se  o olhar ousar ser malicioso, que seja por desejo.

Torna-se obrigatório mãos dadas, abraços, e o fim do sofrimento;

A partir de agora é proibido não ser feliz.


21/08/2012.
Be.

agosto 19, 2012

Dizem que os amigos são os irmãos que escolhemos.
Irmãos que vão embora,
que ficam na lembrança,
a familia de verdade permanece,
não por amor, por obrigação.
Teus amigos vão perguntar se voce está bem,
e te chamar pra tomar cerveja porque se importam,
os outros vão te oferecer a palavra porque convém.

Fato é que, partindo ou ficando,
quando você chora,
você continua sozinha
Com seus pensamentos, com sua dor, com seus caminhos,
suas escolhas, absolutamente só.


julho 24, 2012

Inconversões

O choro tá engasgado
O trago tá profundo
A dor, de covarde, se escondeu
pra machucar onde não deve.
O sangue corre
O pulso pulsa
Tá certo,
    Tá certa.
Nada mudou.

julho 05, 2012

Que me dilacera,
transborda o corpo,
suor,desejo e culpa
num só beijo são.
Que me tira o ar,
fagocita o meu gozo
me junta, me desmonta,
me vira, e suplica.
suplico, Suplicio.


abril 29, 2012

Retrato calado.

Chegar em casa e não te ver,
e tentar não acreditar que a última vez que te vi foi a última vez que te vi.
Os passos menos apressados que o olhar,
mas se atenta nas esquinas, receando que aquela pode ser a última esquina que você passou.
Sempre com medo, consumindo por dentro,
eu não sei até quando você vai aguentar,
sei que mesmo em seus sorrisos, suas andanças,
já não há mais caminhos que te levam a algum lugar.

Então é isso, covardemente não desiste, mas já não tenta,
e eu não sei mais que tipo de sofrimento é esse.

Não sei se a noite você chora calada pedindo a algum deus que te leve, que te salve, que te diga o que fazer,
ou se já esvaziou completamente a mente porque nem pensar mais vale a pena.

Livre de dor, como nunca esteve,
o sonho mais simples, mais barato, mais comum, banal,
e já não vale mais a pena.

Eu vou sofrer cada segundo junto da sua dor ou da sua indiferença,
compartilhando da sua fraqueza, da sua covardia.

Mas não, minha vida não será o sofrimento que fez da tua,
meus passos não serão à esmo,
meus olhos não vão se esvaziar de esperança,
meu corpo não vai desmoronar na cama,
nem minha mente estagnar vendo televisão,
Não fui o fruto dos teus sonhos,
Não fui o inverso de tuas frustrações,
nem tampouco serei a continuidade infeliz da tua existência.

março 04, 2012

Retrato quebrado

“Não sinto raiva, não sinto nada. Sinto saudade de vez em quando, quando penso que poderia ter sido diferente”

A primeira coisa que me ocorreu é que o acordo entre opiniões divergentes é mais fácil se puder escolher a não-ação.
Na situação que se passa, a ação a ser evitada, na verdade, terminada, é minha.
Chegamos ao primeiro ponto, eu não deixarei de agir.
Pra evitar que isso se repita, e porque não quero abrir mão do que me faz feliz para que você fique mais tranqüila.
O segundo ponto é a minha própria definição do que é errado. Errado é aquilo que nos faz mal.
A minha ação me faz bem. Me faz um bem do qual só eu tenho conhecimento.
A tua negação te faz mal.
Me faz mal também, mas machuca muito mais a você.
Não posso falar para não se sentir assim, afinal, tem coisas que não conseguimos controlar tão facilmente,
Mas é importante colocar na balança e ver o que podemos fazer para que, independente do que aconteça ao nosso redor, a gente fique bem.

Por mais que eu tente eu não consigo compreender sua falta de aceitação. Por mais que o senso comum diga que a homossexualidade é errada, não consigo achar isso errado, e não vou me reprimir para ficar de acordo com um senso comum que julgo tão cretino.

Eu nunca acreditei que um dia encontraria alguém com quem eu quisesse dividir minha vida.
Todas as pessoas com quem me relacionei nunca me pareceram dignas das minhas verdades, dos meus sentimentos, e por isso nunca passaram dos dois, três meses ao meu lado. Era tudo muito pouco.

Além do fato de ninguém nunca ter conseguido fazer com que eu ficasse bem comigo mesma.

Lembra quando te disse que eu provavelmente seria como Vinicius de Moraes, que teria vários casamentos porque achava que as coisas esfriavam, acabavam?


Tudo que me disse, me escreveu na verdade, me pareceu que queria apenas me manipular, compreendo sua tentativa, porque sempre deu certo, com o tempo você perceberá que não dessa vez, que não importa o que faça ou fale agora não vai mudar a minha ação.

Você não a conhece, nem um pouco, e o fato de me negar pela minha ação, faz com que não me conheça agora também.

E eu sinto muito por ver que as coisas entre nós estão se perdendo por causa de coisa tão pequena.
E não, eu não consigo me julgar culpada por isso.
A culpa é sua, por escolher ficar do lado feio da história.

Coragem, às vezes, é desapego. É parar de se esticar, em vão, para trazer a linha de volta. É aceitar doer inteiro até florir de novo.

Voce disse para eu “voltar para casa”, num momento que eu realmente estava me sentindo fora dela, mas eu voltei,
Estou em paz com todo mundo, estou em paz comigo.
Estou tão bem, só me incomoda saber que essa sua forma de agir ainda vai durar, que você não vai perder uma oportunidade de dar indiretas, que sinceramente, só ferem a você.
Se você esta sofrendo com minhas ações, é porque você escolheu ver as coisas como tem visto, e é um sofrimento causado por você mesma.
Se esta se sentindo palhaça do circo da vida, me desculpe, mas foi você mesma que colocou o nariz e se entitulou assim, você escolheu ser isso.
Seria bem mais fácil. Bem mais coerente, bem mais benéfico se parasse de sentir e agir sob essa olhar conservador patético que avalia que uma forma de felicidade é errada.

Errado é viver a vida se escondendo, contando com o julgamento dos outros, como você faz.
Acho que o que mais te incomoda nisso tudo é você saber que as pessoas vão olhar pra mim e ver de forma preconceituosa. Te incomoda a aparência disso tudo,
De eu não ter sido a filha que você criou pra ser uma extensão de você.

E eu não serei, porque tem condutas que você adotou para sua vida que me fariam infeliz,
Eu jamais viveria em função de aparência, como as vezes parece que você vive, parece que so importa o que as pessoas vão julgar de você.
E jamais ficaria reclamando solidão trancada no quarto.

Pode ser coisa efêmera da juventude, mas o mundo ta ai se mostrando pra mim, e eu também vou me mostrar pra ele, vou fazer tudo que acho que me fará bem, vou viver conforme os conceitos, não conforme os preconceitos arcaicos da sociedade.

Já pensei o oposto, mas hoje em dia me parece que você é muito mais uma mulher de Atenas no sentido histórico-literal da frase.

Meu Deus, afasta de mim os venenos diários de quem não acrescenta, só diminui.

fevereiro 04, 2012

Pretérito retrato



A verdade é que sempre decepcionaremos as pessoas.
Não por errarmos demais,
mas por elas continuarem cometendo o erro de esperar que nossas conquistas construam suas felicidades.

E vamos ainda ser muito decepcionados,
por esperarmos que a aspereza dos outros seja apenas um erro,
e não a essência daquele que não te oferecerá mais apoio.

Sofreremos calados,
porque a dor só é nossa,
e dividi-la seria inadimissível,
tentar mensura-la seria tão somente estúpido
quanto a estupidez de quem oferece o tapa, não a ajuda.


A dor feriu fundo,
feito faca que mata, lentamente,
matou parte de mim.
Digo adeus ao espelho,
e se eu disser saudades é mentira.


janeiro 12, 2012

Sei lá,
vou seguindo,
mas dá uma vontade danada de chorar.

Olho pra trás, já não vejo quase nada,
como naqueles sonhos bons,
que lembramos borrados e confusos,
mas que desperta o desejo de voltar a dormir.

Sonho meu,
que nos reste fé e paciência,
ou que saibamos inventa-los.